Elias Mateus Isaacǁ O conceito filosófico e técnico da palavra justiça, está relacionado ao que é correto, ético, moral, justo, honesto e independente das consequências. Tanto por parte da sociedade, que se define como justa quando age sempre de forma correta e obediente às leis, quanto das instituições públicas, que praticam, fiscalizam, controlam e administram a justiça. As instituições públicas de justiça possuem autoridade constitucional para fazerem julgamentos em prol da rectidão, honestidade, imparcialidade e do bem comum, sem oprimir, sem constranger, sem tripudiar e sem manipular. As instituições públicas de justiça devem ser firmes, isentas de qualquer contaminação de parcialidade e influências, sem extrapolar os limites de sua competência, e sem subjugar-se aos interesses político-partidários.
O conceito lógico permite-nos concluir que, quando as instituições de justiça, antagónica, abusiva e violentamente falham, então impera a injustiça sistémica, institui-se um governo da acção errada e desmedida, parcial, preconceituosa, discriminatória, autoritária, corrupta e fraudulenta. A justiça torna-se lenta e ineficaz, quando convém. Veloz e implacável, quando é para satisfazer o interesse partidário.
Quando as instituições de justiça têm comportamentos dualistas fica muito claro discernirmos o joio do trigo. Mas, o perigo mora no sofisma, ou seja, quando a mentira vem deliberadamente embrulhada numa embalagem de verdades e retóricas populistas, manipuladoras e enganadoras, embalada como produto mediático. Essas tentativas de indução ao erro para justificar os próprios delitos e/ou intenções suspeitas, são como metástases que ofuscam a percepção daqueles que instintivamente tendem a acreditar na boa intenção do ser humano, aqueles que, ainda acreditam nas instituições de justiça de Angola.
É muito chocante e vergonhoso assistirmos, impávidos e impotentes, a injustiça e a mentira imperarem, principalmente entre aqueles que constitucionalmente deveriam ser os seus guardiões. Quando esses pseudo-doutores abusam da sua autoridade, competência e funções, o sentimento de abandono e insegurança do diferente e do povo é grande e põe em risco a estabilidade da ordem política e social. Porém, esse risco é ignorado pela ganância, arrogância, prepotência, vaidade, autoritarismo complexado, medo, pela insegurança e mentalidade criminosa e impune das instituições.
É muito chocante e desumano quando vemos, ouvimos e vivemos as atrocidadas do sistema de justiça injusta acontecerem contra as nossas próprias vidas e comunidades. Além da sensação de insegurança, vulnerabilidade e falta de protecção surge o enorme sentimento de impotência e resignação. Os diferentes, o povo, que são o polo mais frágil, opostamente posicionados em relação à estes “doutores”, nos sentimos de mãos atadas, fragilizados e com a guilhotina colocada aos nossos pescoços que nos fazem lembrar e reviver as práticas fascistas e esclavagistas.
É assim que nós nos sentimos. De um lado os ditos “doutores”, procuradores e juízes que julgam saber tudo e tudo poder, condenam, prendem, anulam, rejeitam e sonegam a justiça aos diferentes e empobrecidos sempre que for conveniente aos interesses políticos e sociais do Partido. Infelizmente, isto é feito com o nosso dinheiro dos impostos e contribuições. Nós o povo, não eles, é que pagamos pela justiça injusta perpetrada contra nós. Os doutores “juízes e procuradores”, pagos por nós, implacavelmente administram a justiça injusta contra nós, porque julgam-se serem todo-poderoso, intocáveis e imortais que dormem por cima da constituição e das leis do país.
Em Angola, 99,999% dos juízes e procuradores são militares de carreira, oficiais superiores, membros de direcção do partido-único-estado, membros nos comités de especialidade partidária e dos caps. Neste contexto nunca será possível termos no país um sistema de justiça justo, imparcial, honesto, ético, moral, transparente, independente e, acima de tudo, humanizado.
A justiça injusta de Angola é um problema sistémico, institucional, político e de índole ideológico-partidário, arma exclusiva de violência da governação durante meio século, que foi propositadamente esvaziada dos seus conceitos e princípios filosóficos da ciência jurídica e contaminada pelo vírus partidário. Não respeita a ética nem a moral, não tem alma, não é humanista. É um mero instrumento político-partidário para garantia da manutenção e perpetuação do poder e interesses económicos da oligarquia autoritária e corrupta, que implacável e incansavelmente intenta para o aniquilamento do diferente e decapitação na sua guilhotina do povo empobrecido e desprotegido.
*Adaptado do artigo “Justiça Injusta” de Hyde Ribeiro, 2018.