

Esse cenário se perpetua a partir da Antiguidade e ultrapassa a Idade Média, a Modernidade e chega aos nossos dias através de discursos essencialistas, que utilizam a ‘natureza’ como escopo e justificativa para construções sociais, atendendo, dentre outros propósitos, a fins de dominação do masculino sobre o feminino. E, essa dominação masculina se projeta nas mais variadas estruturas sociais, desde as actividades produtivas, baseadas nas divisões sexuais do trabalho, como nas actividades reprodutivas, correspondentes aos papéis do homem e da mulher na reprodução biológica.
Todavia, entre os séculos XIX e XX, as primeiras vozes se tornam audíveis quando se trata da defesa dos direitos femininos. O movimento feminista surge e com ele as primeiras contestações sobre a violência imposta e a negação de direitos. Aos poucos e de forma árdua se dá o reconhecimento dos direitos femininos. As mulheres passam a ser vistas como cidadãs, portadoras de dignidade.
Ainda assim, a situação feminina, em muitos locais do planeta é de extrema vulnerabilidade. Há países em que a liberdade do homem significa, simultaneamente, a submissão da mulher, e os direitos de igualdade se transformam em mera retórica, pois a liberdade civil não é para todos, é atributo masculino e depende umbilicalmente do direito patriarcal. Nesses locais não há reconhecimento de direitos para as mulheres, tão pouco proteção legal. Em outros tantos, o reconhecimento de direitos existe formalmente, mas a sociedade ainda está arraigada a uma cultura milenar que acusa o homem como superior e, consequentemente, a mulher como inferior.
Na contemporaneidade, a dominação e a exclusão das mulheres estão ancoradas no patriarcado que se compõe de duas fases. O pai exerce o poder sobre as filhas, e, posteriormente, o marido exerce o poder sobre sua mulher; contudo, o poder do marido é multifacetado. Além de exercer poder político no espaço público, o marido exerce poder sexual, legitimado pelo casamento – que também é modalidade de contrato, no espaço privado.
A dominação não é simples, mas complexa, sistemática e interseccional; manifesta-se em várias perspectivas: étnica, sexual, econômica, política e jurídica. A subalternidade feminina existe, também, na perspectiva jurídica, pois, o Direito é um dos meios mais eficazes de dominação masculina; daí porque as leis foram, e ainda são feitas em sua maioria, por homens, interpretadas e aplicadas igualmente por homens.
Contudo, da mesma forma que o Direito pode ser instrumento de dominação, também pode se transformar em instrumento de emancipação! Um dos direitos mais importantes para a emancipação e o empoderamento das mulheres é o direito à educação!
Através da educação o ser humano consegue compreender e mensurar a sua importância no contexto social e político; desvenda os meandros da convivência humana, ao passo que, também, compreende melhor a si e ao outro; consegue avaliar, discernir, criticar, contestar…..transformar!
As transformações causam temor aos que estão no controle da situação. O inesperado, o desconhecido, o transformado, o novo, angustia, traz dúvidas e inquietações. O medo de perder o poder é iminente aos que estão no comando há milênios!
Entretanto, a emancipação das mulheres não significa a tomada drástica e inexorável do poder dos homens, mas um compartilhamento! O reconhecimento dos mesmos direitos, da mesma humanidade, da mesma condição de ser gente….de ser humano!
E, essa mudança só será possível através da educação das meninas. O aprendizado, a leitura, o conhecimento, a reflexão, as oportunidades de trabalho, que garantem o empoderamento econômico, são urgentes e necessárias. Só através da educação essas mulheres poderão, inclusive, compreender sua importância no contexto familiar e social e se encorajar a romper o silêncio, denunciando seus agressores!
Em muitos países, a situação de vulnerabilidade das mulheres e das meninas é flagrante e desesperadora em face das violações a que são submetidas sistematicamente! Essa violência afronta os direitos humanos mais elementares e causa prejuízos de ordem social, económica e psicológica. Sensibilizar os governos a tomarem medidas institucionais, por muitas vezes, é tarefa hercúlea, pois muitas questões podem está por traz desse tipo de violação de direitos, inclusive questões de ordem religiosa.
Malala simboliza a luta de muitas meninas e mulheres violadas em sua condição de pessoa, afrontadas em sua dignidade e relegadas ao esquecimento. Uma menina comum, que morava no interior do Paquistão ver sua vida transformada, para não dizer, quase aniquilada, por desejar, simplesmente, aprender!
Após o atentado que a vitimou, sobreviveu e este mês conquistou o Prêmio Nobel da Paz por sua coragem de acreditar que as pessoas podem e devem viver movidas por seus sonhos. Podem e devem aprender! Podem e devem lutar pelo que acreditam! Podem e devem promover a paz e a fraternidade entre as pessoas, independentemente de serem cristãs, muçulmanas ou hindus; de suas nacionalidades; de serem homens ou mulheres!!
Todavia, apesar dos esforços de Malala e de tantas outras mulheres, a humanidade só alcançará o patamar da igualdade entre as pessoas humanas pela autonomia do discurso e da acção, através da educação que democratiza e universaliza o conhecimento!