O estado de democratura

O estado de democratura
JOSE 333
[Pt|rmc]

Por Nuno Dala|| Angola é um estado democrático? A resposta a esta questão é um retumbante não.

A realidade demonstra que Angola é um estado ditatorial travestido em democracia. Angola é uma democratura, um estado democraturático.

A democratura (democracia + ditadura) é um sistema complexo em que formalmente a democracia é o sistema político do estado, mas, na verdade, de facto, a democracia não passa de uma capa, uma máscara que esconde uma ditadura.

O que é ditadura? Em termos objectivos, ditadura é um regime governamental em que todos os poderes do Estado estão concentrados num indivíduo, um grupo ou um partido. O ditador não admite oposição a seus actos e ideias, possui poder e autoridade absoluta. É um regime antidemocrático onde não existe a participação da população. O poder está apenas numa instância, ao contrário do que acontece na democracia, onde o poder está em várias instâncias, como o legislativo, o executivo e o judicial; [neste sentido], o ditador busca controlar os sectores mais importantes de seu país, para legitimar sua posição(1).

Estabelecimento da ditadura: O regime ditatorial moderno quase sempre resulta das seguintes realidades:

A)Convulsões sociais profundas: geralmente provocadas por revoluções ou guerras. Também houve muitos regimes ditatoriais que decorreram das disputas políticas da guerra fria.

Em Angola a ditadura foi estabelecida em 1975. Depois de um processo revolucionário de vários anos, levado a cabo pelos movimentos FNLA, MPLA e UNITA, a ditadura do MPLA se instalou, como um dos resultados terríveis do fracasso do Acordo de Alvor e de agendas que colocaram os interesses de grupo acima dos interesses dos angolanos (o povo). Em 2015 a ditadura suportada pelo MPLA completa 40 anos.

B)Golpe de estado civil: Nem sempre as ditaduras se dão por golpe militar. Podem surgir por golpe de estado civil ou a partir de um grupo de governantes democraticamente eleitos que usam a lei para preservar o poder, como aconteceu, por exemplo, na ditadura imposta por Adolf Hitler na Alemanha nazista. O golpe se desencadeou a partir das próprias estruturas de governo, com o estabelecimento de um estado de excepção e posteriormente, a supressão dos outros partidos e da normalidade democrática.

Policia
[Pt|rmc]. A violência institucional é uma marca da democratura.
O papel do caudilhismo: sempre regidas pelo esforço de achar legitimidade, as ditaduras se apoiam em teorias caudilhistas, que afirmam muitas vezes do destino divino do líder, que é encarado como um salvador, cuja missão é libertar seu povo, ou ser considerado o pai dos pobres e oprimidos, etc.

Implantada ditadura em 1975, Agostinho Neto foi elevado às categorias exclusivas de Líder Imortal da Revolução Angolana, Fundador da Nação e Herói Nacional. Sobre Agostinho Neto foi construída uma narrativa exaltadora que chegou a assumir proporções anedóticas. Como se as categorias que mencionamos não fossem já suficientes, ele foi elevado à categoria de Poeta Maior.

Quanto a José Eduardo dos Santos, há títulos de todo tipo no que à bajulação caudilhistas diz respeito. Ele é o Arquitecto da Paz, a Espécie Rara, o Patriota, o Magnânimo, o Querido Líder

A institucionalização do poder: Outras ditaduras se apoiam em teorias mais elaboradas, utilizando de legislação imposta, muitas vezes admitindo uma democracia com partidos políticos, inclusive com eleições e algumas vezes até permitindo uma certa oposição, desde que controlada. Os dispositivos legais passam a ser institucionalizados e o são de tal forma funcionais, que sempre ganhará o partido do grupo hegemónico.

Manutenção da ditadura: são formas ou métodos de manutenção da ditadura as seguintes:

A)Força bruta: as ditaduras sempre se utilizam de força bruta para se manterem no poder, sendo esta aplicada de forma sistemática e constante.Em Angola o regime está fortemente militarizado. Angola é o país dos generais. Note-se que embaixadores, governadores, salvo as devidas excepções, são todos generais. A Unidade da Guarda Presidencial exibe uma força bruta quando o presidente sai do palácio, quer para visitas pelo país quer para o exterior. Quanto às deslocações no interior do país, em Luanda ou noutras províncias, tal exibição de força revela-se exagerada. Mas é evidente que o recado claro é a intimidação e dissuasão. José Eduardo dos Santos não é acessível ao povo que diz servir. Mantém-se distante do mesmo, o que revela também medo, pois está ciente das suas abundantes delinquências.

Funeral Hilberto Ganga
[Pt|rmc]. Luta pela democracia resulta em morte.
 B)Propaganda: trata-se da propaganda institucional, propaganda política constante e de saturação, de forma a cultuar a personalidade do líder, ou líderes, ou mesmo o país, para manter o apoio da opinião pública; uma das formas mais eficientes de se impor à população um determinado sistema é a propaganda subliminar, onde as defesas mentais não estão em guarda contra a informação que está a se introduzir no inconsciente colectivo. Esta se faz por saturação em todos os meios de comunicação.

I.Propaganda institucional: a propaganda institucional em Angola (como, aliás, é típico das ditaduras) projecta a imagem de um regime cujo líder é apresentado como sendo uma sumidade humana na governação, um verdadeiro mago na arte de trabalhar em prol do seu povo. O governo (executivo, segundo a Constituição) é apresentado como ele mesmo, ou seja, José Eduardo dos Santos, é o próprio executivo. Ministros, secretários de estado, governadores, etc. não passam de seus auxiliares. Estes sempre falam do ‘excelente trabalho do executivo, sob a liderança clarividente de Sua Excelência Senhor Presidente da República, o Engenheiro José Eduardo dos Santos’.

II.Propaganda política constante e de saturação: o regime que [des]governa Angola desde 1975 leva a acabo uma propaganda caracterizada pela constância na repetição de chavões e expressões bem trabalhados para criarem impressão sobre as massas. Chomsky (2010) identifica 10 formas ou estratégias de propaganda cujo objectivo é a manutenção do poder do grupo hegemónico. Esta propaganda consiste em entorpecer a capacidade crítico-analítica das massas. Imbecilizar as massas, de tal sorte que as mesmas permaneçam na condição de inércia. As estratégias da gradação (aplicação gradual de uma medida inaceitável), do deferido (fazer passar medidas inaceitáveis em nome do bem-estar geral, ou do futuro), da infantilização (uso de linguagem de tonalidade, toque e apelo de cariz infantil, como se o povo consistisse em crianças), da manutenção da ignorância e mediocridade (mantendo um mau sistema educativo, por exemplo), do conhecimento profundo da natureza das pessoas (as ciências humanas e sociais assim como outras fizeram enormes progresso no conhecimento da forma de ser e estar do ser humano) e outras são de grande utilidade aos regimes.

Juizes
[Pt|rmc]. Poder judicial sob às “axilas” do democrator.
 Quanto ao regime angolano, este conseguiu imbecilizar ou idiotizar a vasta maioria dos angolanos, os quais demonstram uma inércia inenarrável diante das abundantes violações dos seus direitos, liberdades e garantias. Os angolanos vivem sob tremenda miséria, mas, além de a vasta maioria não reagir no sentido da reposição dos seus direitos e, como tal, da sua dignidade, é um facto que uma grande parte dos cidadãos defende José Eduardo dos Santos e seu regime maléfico. Não são apenas os militantes do MPLA. Não. Os angolanos que apoiam os agentes do mal são aos milhões. Note-se que, embora a fraude certamente tenha desempenhado seu papel, nas eleições milhões de cidadãos votam no MPLA, ou seja, no mal. Infere-se claramente que o estado imbecil de uma maioria vasta inviabiliza revoltas.

III.Propaganda subliminar: o que é a propaganda preliminar? Ora, a palavra preliminar significa algo “que não está explícito, mas é subentendido, que não atinge o limiar da consciência, mas pode ter efeitos a nível subconsciente”(2), “algo que actua de forma indireta no subconsciente das pessoas de modo a atingir o objectivo desejado, na consciência delas”(3). Assim, fica claro que a propaganda subliminar actua como instrumento de domesticação das massas, as quais, de forma inconsciente, interiorizam mensagens que condicionam seriamente sua capacidade crítica. Em Angola, é interessante que nas cédulas do Kwanza, no bilhete de identidade, na bandeira nacional, na insígnia da república e outros meios está presente a mensagem subliminar de que o grupo hegemónico é o povo e o povo é o grupo hegemónico, ou seja, o regime é a essência do povo angolano como ente político. Desta forma, não surpreende que os angolanos estejam sob um atarantador estado de inércia e resignação diante de um regime que urina permanentemente no seu rosto.

  1. Censura: a censura também tem um papel muito importante, pois não deixa chegar as informações relevantes à opinião pública que está a ser manipulada. Desta forma, ficam atados os dois extremos: primeiro satura-se o ambiente com propaganda a favor do regime, depois são censuradas todas as notícias ruins que possam vir a alterar o estado mental favorável ao sistema imposto.

Notas

1.http://www.significados.com.br/ditadura/ehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ditadura

2http://www.priberam.pt/dlpo/subliminar

3http://www.dicionarioinformal.com.br/subliminar/

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