Por Serge Katembera|| As novas tecnologias são uma oportunidade para os jornalistas africanos. Uma oportunidade relativa. A chamada (r)-evolução tecnológica está modificando radicalmente os hábitos de consumo tanto dos jornalistas quanto dos leitores e telespectadores. Se durante muitos anos a África parecia ser o continente mais atrasado em termos de uso da tecnologia numérica como afirmou Manuel Castells no terceiro volume da sua trilogia sobre a Sociedade em Rede, está claro que hoje o “continente negro” se tornou uma oportunidade para todos.
Mas, os jornalistas africanos estão mesmo aproveitando essa oportunidade? Há alguns anos decidi sair da rotina do jornalismo clássico que havia estudado na escola de jornalismo e procurei investir no numérico. Abri um primeiro blog – que posteriormente fechei – onde comecei a treinar o domínio da plataforma Blogger. A experiência que não deixava de ser lúdica me levou a participar de um concurso organizado pela Radio France Internationale, uma das rádios mais importantes do mundo, tendo me tornado um dos seus blogueiros mais experimentados em muito poucos anos.
Em várias ocasiões tive a oportunidade de visitar países como a Costa do Marfim e Senegal e observei de perto a dinâmica na área das novas tecnologias da informação e comunicação. “Novas tecnologias trouxeram a necessidade de novos usos”; os jovens desses países entenderam que as novas tecnologias poderiam ajuda-los a abrir novas portas, a criar comunidades de blogueiros fortes, activistas influentes ao ponto que os políticos desses países integraram a ideia de que um diálogo com essa nova elite numérica é imprescindível para o avanço das suas democracias.
O que observei nesses cinco anos em que me envolvi com as novas mídias foi uma estratificação no nível continental de tal forma que a África central parece estar atrasada em comparação com o sul, norte e leste. A Primavera árabe mostrou que o Egipto tinha uma grande cultura digital. Manuel Castells chegou a escrever em Redes de indignações que 80 % dos egípcios tinham uma conexão à Internet no início das revoltas. Acredito que na Tunísia a situação não era muito diferente.
Contudo, países como a República Democrática do Congo continuam atrasados na implementação de uma infraestrutura consequente nessa área. Recentemente, o governo congolês bloqueou as comunicações via celulares e Internet, numa das medidas mais controvérsias dos últimos tempos. Isto não pode ocorrer. É politicamente insustentável e o custo é muito grande.
Não me parece tão-pouco que os jornalistas africanos estejam investindo maciçamente nas novas tecnologias e consequentemente no jornalismo digital.
Como eu disse no início, as novas tecnologias são uma oportunidade relativa. Essa relatividade se dá por um paradoxo: a oportunidade existe, mas apenas será útil para quem souber aproveitar o mercado.
Os números são gritantes. O crescimento na África alcança número que daria inveja a potências económicas como o Brasil, a Índia ou a China. O Ruanda cresce anualmente mais do que o gigante asiático. A R.D. Congo cresce 7 % por ano, Angola está com um crescimento de dois dígitos. Não quero discutir a dimensão social desse crescimento, apenas pretendo apontar que se os africanos não souberem aproveitar outros irão fazê-lo.
Recentemente, o jornal francês LeMonde.fr abriu uma versão digital do seu site integralmente dedicado à África. O investimento é imenso tendo como um dos principais accionistas a Fundação Bill e Melinda Gates. O projecto é ter uma notícia produzida para e pelos africanos. Alguns dos meus amigos blogueiros camaronenses e beninenses foram contratados para produzir uma “informação local”.
É uma tendência do mercado. Da crise do jornalismo na Europa nasce uma oportunidade em África, mas somente para aqueles que souberem investir na área, isto é no uso das novas tecnologias. Somente o jornalista 2.0 será adaptado par o novo mundo do jornalismo digital.
Não estou falando de um futuro revelado e hipotético; trata-se da realidade tal como está acontecendo no ritmo da vida conectada…
Também, o rigor académico me obriga a apontar para uma realidade escondida atrás desse tipo de investimento como o do jornal Le Monde, a saber, a problemática da terceirização da informação. O mercado do jornalismo digital está submetido às mesmas mazelas da economia real onde a busca por novos mercados mais baratos parece ser a única estratégia para o futuro. Desta vez, o mercado é a África. Para bem ou para o mal.