

Em tempos em que a razão política adoece e a justiça social silencia, resta à poesia o dever de dizer o indizível. Este poema é a alma de um povo que sangra — em versos. Uma denúncia lírica da angústia colectiva, onde o silêncio das palavras é preenchido pelo clamor da dor.
Tempo Sombrio
Um poema político sobre Angola
Céu nublado,
Sol acabrunhado,
E eu com uma dor almática,
Pelo pesadume apossado…
Numa Pátria insorridente,
Inibida de vivenciar beatitude,
Melancólica, anelando o advento de um presente…
Presente risonho, condicionado por horripilantes bichos…
Nela o sol já não sorri,
Os dias são incolores,
As flores murcharam,
E a brisa já não tem sabor…
Já não tem cheiro,
Além de horror,
Tempo atordoado,
Enfim, uma prisão moderna-mor…
Prisão, com barras de medo,
Guardada por bichos, cujo poder sobrepujou a moral,
Alucinadamente plêiade,
Acervo desumano e irracional…
No deserto, percorrendo veredas áridas,
Sem esperança, além de Deus e seus filhos…
Num cárcere escuro, sem o lumiar da esperança,
Um pouco silencioso e sombrio…
Só um pouco de tumulto,
Resmungo que emana de seus filhos,
Com os nervos à flor da pele,
Jorrando lágrimas, de estômagos vazios.
— Kanienga L. Samuel







