Por Domingos da Cruz || O controlo de conteúdo midiático na imprensa sob tutela do poder hegemónico angolano, caracteriza-se basicamente pelas seguintes categorias: concepção da informação, gestão, direccionamento e distribuição do conteúdo. Este esquema concretiza-se por meio da empresa de midia, Semba Comunicações, propriedade de dois filhos do Presidente da República, Tchizé dos Santos e Paulino dos Santos, aos quais lhes foi concedida a missão de conceberem os programas. Talvez seja inegável que um dos espaços chaves de manifestação de influência real e simbólica é a midia, onde usando da retórica participa-se da vida política.
Nos casos em que a midia é livre, há espaço para contradição e dinâmica permanente da esfera pública. Quando ela está controlada no âmbito tecnológico, na concepção, produção e distribuição de conteúdos, assiste-se a inversão de realidades impensáveis a séculos, tal como o novo direccionamento e estilo que o Jornal de Angola deu a forma de produzir caricaturas.
O grau de controlo de conteúdo ganhou uma grande sofisticação, que se manifesta também no direccionamento e gestão da mensagem que a caricatura transmite. A manipulação, a propaganda e exaltação do regime e do seu líder-mor é tão intensa e generalizada que não dá nenhuma margem para a crítica simples, divertida, como da caricatura.
A caricatura na sua essência é crítica. Ela visa ridicularizar de forma descontraída a realidade: pessoas, o mundo, factos, Deus, etc. Ao mesmo tempo que ela é humor, também é sátira. No jornal estatal há uma rubrica, a Imgem do Dia, na qual publica-se caricaturas. Esta página estabeleceu uma nova escola, pelo menos do ponto de vista prático, faltando somente sustentáculos teóricos. Esta página visa elogiar o regime, suas realizações e elevar a imagem do Presidente da República à todo custo. Curiosamente, existem ocasiões em que ela volta a originalidade da caricatura, ganha um tom satírico quando se lança contra personalidades de movimentos sociais críticos, partidários da oposição ou contra o ocidente. Diante deste quadro, parece que há uma intuição prévia na qual esta análise prefere mergulhar com auxílio da presidente da Argentina: “não há um pouco nem mais ou menos democracia. É como estar grávida. Ou se está grávida ou não se está. Com a democracia acontece o mesmo. Ou se está em democracia e se respeitam […] os direitos e garantias ou não se está em democracia”. (KIRCHNER apud MONIZ, 2009, p.22). Com esta imprensa de conteúdo sob controlo se pode falar da existência de democracia? Que democracia? Aquela que foi anunciada pelos teóricos do liberalismo no ponto inicial da empreitada em comunhão com a Constituição da República de Angola?