A luta pela democracia no século XXI

A luta pela democracia no século XXI

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Domingos da Cruz II Quando em 1989, Francis Fukuyama publicara o artigo o Fim da História, e em 1992 retoma o mesmo tópico, e pública em livro — O Fim da História e o Último Homem — numa análise mais refinada e aprofundada, reacendeu o optimismo sobre a democracia liberal alicerçada na lógica do mercado e do capital. Uma democracia que exclui o diferente e que se estenderia para todos os recantos do mundo de maneira uniforme. Passadas mais de duas décadas, não só se revelou uma análise falha, mas nos últimos doze anos as métricas sobre a democracia indicam o declínio, retrocesso e crise da sociedade aberta. Para Mbembe (2007:21), estamos a viver um “um tempo que promove a saída e decomposição da democracia”.

Panorama global da democracia no século XXI

De acordo com o barómetro mundial da democracia, publicado em Janeiro de 2018 pela Freedom House, nos últimos doze anos há um declínio rápido da democracia em todo mundo.

O ocaso da democracia na Europa é visível a olhos desarmados. Mesmo sem análises científicas refinadas notamos claramente os inimigos internos da democracia em progressão.

De acordo com o filósofo camaronês Achille Mbembe, na sua obra Políticas de Inimizade, o retrocesso democrático da Europa não se sinaliza somente na regressão das suas políticas públicas de matriz social. Esta crise expressa-se também no aprofundamento do ódio, na cristalização da categoria Outro como inimigo a bater para construir a democracia do semelhante, que em última análise é uma falsa de democracia. Mamadou Ba, argumenta que esta velocidade do ódio, do “apartheid”, dos muros físicos e simbólicos, em fim, a democracia excludente, funda-se no passado colonial e esclavagista. Eu acresceria a ideologia da superioridade fenotípica como outra base fundacional da pulsão mórbida contra o outsider.

O inimigo, os inimigos construídos na sociedade europeia (os não-semelhantes) e que apontam para a decadência moral e política da sociedade são as categorias racializadas e ideologicamente construídas a partir da ficção criativa ocidental, que se tornaram tormento e retiram o sono aos europeus, neste caso, são o imigrante, o árabe, o negro, o requerente de protecção internacional e o cigano.

A decomposição e petrificação da sociedade aberta na Europa, se pode identificar em opções políticas amplamente mediatizadas:

Itália, Alemanha, Holanda, Áustria (Suécia?!). Têm em comum o avanço da extrema-direita. Aqui a responsabilidade não é exclusiva dos partidos e os chefes destas organizações. É também dos cidadãos. Estes partidos não surgiriam se não houvesse uma base de apoio e respaldo favorável dos cidadãos.

Dinamarca. Partilha a mesma ferida moral colectiva, mas aprofundou o drama ao introduzir na lei de imigração o confisco dos bens dos requerentes de protecção internacional que cruzarem as suas fronteiras.

Malta. Negação da liberdade de expressão e de imprensa. Morte de jornalista como é o caso de Daphne Galizia.

Eslováquia. Assassinato do jornalista Jan Kuciak e sua namorada Martina Kusnirova.

Macedónia e Sérvia. A primeira vive agora sinais de esperança com o novo governo que parece trazer esperanças de construção de uma sociedade aberta, fundada sobre os princípios da democracia. Ao contrário, na Servia o chefe do poder executivo, Alexander Vucic promove a perseguição da oposição e da imprensa livre.

Espanha. Contra todas as espectativas, o país voltou a lógica franquista e fez presos políticos por se baterem pelo direito à autodeterminação da Catalunha. Como se as prisões politicamente motivadas não bastassem, há sinais claros de manipulação do judiciário pelo poder executivo, uma situação confirmada pela mais recente reivindicação de liberdade na e para a justiça, por parte dos agentes do sector.

França. Com a chegada de Emmanuel Macron ao poder, parece haver obsessão pelo reajuste do défice conforme as directrizes da União Europeia. Isto levou o novo presidente a desencadear uma onde de cortes e reformas no sector público, pondo em causa o bem-estar de muitos cidadãos, uma variável fundamental para a saúde ou não da democracia.FitW1_820px_Global_Status_Pie_Chart-cropped

A Turquia, uma ponte entre o Oriente e o Ocidente, que há dez anos caminhava para um processo de democratização assinalável, e com pretensões de integrar a União Europeia, descarrilou. Recep Tayyip Erdoğan, presidente Turco, após a tentativa de Golpe de Estado, segundo a narrativa oficial, por isso é questionável, ele (o presidente), decidiu atribuir a si mesmo poderes imperiais por meio de alteração à Constituição; politizou e controla o judiciário; amordaçou a imprensa; colocou a sociedade civil sob vigilância com prisões a mistura; promove perseguições políticas interna e externamente; suspendeu a liberdade académica e científica; e solicitou a intervenção da comunidade internacional para o apoiarem nas suas façanhas, tendo causado mal-estar com os EUA, Holanda, Alemanha e o bloco Europeu em geral por não respeitar os princípios basilares do Estado de Direito.

Na região da Eurásia há portas de liberdade que se abrem, mas outras se fecham em países como Uzbequistão, Quirguistão e Arménia. Neste sentido, há sinais de esperança, embora o alerta amarelo deve manter-nos vigilantes. Em pleno século XXI, os cidadãos do Uzbequistão precisam autorização das autoridades governamentais para exercerem o direito de ir e vir, ou seja, para sair e entra no país só com a permissão do governo! Surreal! Mas, nos últimos anos o governo permitiu a entrada da missão de monitoramentos dos Direitos Humanos da ONG Human Rights Watch.

O Quirguistão e a Arménia continuam a realizar eleições que não encaixam nos padrões mínimos internacionais, dali a evocação permanente de corrupção dos processos eleitorais.

O Estado autoritário na Federação Russa avança. O caso Russo é de grande preocupação por ser um país com grande capacidade de influência geopolítica global. Putin e seus apoiantes não só reforçam a negação da democracia no plano interno — eleições questionáveis; oposição, sociedade civil e imprensa amordaçadas — mas expande esta cultura política fechada ao mundo.

A Rússia financia grupos de extrema-direita na Europa (e a esquerda quando convém), mina a expressão da verdade eleitoral, tal como parece ter feito nos EUA e no Reino Unido.

Outro colosso mundial cuja capacidade de influência é imensurável vem da Ásia: a China. Esta potência económica começa agora a minar democracias como a de Hong Kong e de Taiwan, sob pretexto de manter a unidade da China, mas põe em causa o princípio “uma China e dois sistemas.”

Segundo o relatório Democracy in Crisis, a China tem tentado desestabilizar e minar as bases das democracias da Oceânia: Austrália e Nova Zelândia.2D0D3849-C4B6-44DA-803D-B67FDD8017C8_cx4_cy0_cw88_w408_r1_s

Do outro lado do oceano, os Estados Unidos também tem a sua cultura política democrática em declínio. Os indicadores do declínio residem na violação dos direitos civis e políticos na última década. Este declínio se aprofundou com a chegada de Trump ao poder. Desafiando a tradição democrática americana, nomeou parentes próximos para cargos públicos, pôs em causa interesses públicos frentes aos interesses privados de natureza comercial.

A sua afronta às instituições foram mais longe, quando debochou das decisões judiciais que não correspondiam as suas pretensões; ameaçou publicamente jornalistas e órgão de comunicação incómodos. Num elogio dirigido a China, falou sobre a possibilidade dele (Trump) manter-se por tempo indeterminado no poder, a semelhança da mudança constitucional naquele país, que deu ao Presidente Xi Jinping a base legal para manter-se no poder até a morte, caso desejar. Por tudo isso, os EUA já não mais é visto como um exemplo de democracia.

Na zona da Asia-Pacífico a negação — por parte das elites — de uma cultura política de liberdade não pára de crescer:

No Myanmar após os acordos de paz que partilhou o poder entre os militares e os civis, elevando a esperança que construiriam uma sociedade aberta e inclusiva, eis que decorre há vários meses uma grande limpeza étnica e religiosa contra a minoria muçulmana Rohingya, levada a cabo pelos militares.

No Camboja o Primeiro-ministro Hun Sen não dá descanso à sociedade civil, a oposição e a imprensa (foi encerrado o jornal mais influente do país, o Cambodia Daily). Estão todos sob perseguição e pressão política. Este ímpeto autoritário manipula e controla também a justiça.

Nas Maldivas a liberdade de expressão e de imprensa está suspensa. E em 2017 foi assassinado o proeminente jornalista Yameen Rasheed. Para agravar a negação do Estado de Direito e Democrático os militares interferem na vida política a favor do grupo que detém o poder, inviabilizando o direito de oposição democrática.

A situação geral da Democracia na América Latina é ao mesmo tempo de avanços e retrocessos. O colosso da região, Brasil com um governo de direita que chegou ao poder por meio de um golpe parlamentar com a contribuição do poder judiciário capturado por motivações ideológica e pelo mercado, somam e seguem no processo de desmantelamento dos direitos sociais, na exclusão de quilombolas, índios e negros a favor de uma elite retrógrada que acredita ser branca e superior. Por tudo isso, estamos diante de um país que alcançou um grande reconhecimento nos últimos treze anos, e vê agora a sua reputação na lama por causa de uma elite atrasada.104567940-RTX39ZMQ-putin-xi

A situação política, social, económica e cultural de um Brasil em retrocesso vertiginoso — que voltou ao mapa da fome, aos assassinatos políticos, a barbárie — é agora a síntese de uma América Latina que a todo instante teme a voracidade imperial dos Estados Unidos que vê no continente vizinho um inimigo a domar.

O Equador vive um momento que expressa a importância da alternância do poder. Com a eleição do novo presidente Lenín Moreno, substituto de Rafael Correa, assiste-se ao aprofundamento da democracia em todos os campos essenciais de uma sociedade aberta.

Depois de sucessivos governos de esquerda na Argentina, chegou ao poder a direita que está a regredir os direitos sociais e viabiliza uma onde liberal que pode levar ao horror económico e social, como consequência de escolhas política igualmente horrorosas.

Na Colômbia houve reforma jurídico-política com vista a proteger a liberdade pessoal por meio da alteração a lei da prisão preventiva. Por outro lado, foi alcançado um acordo de paz com as FARC, viabilizando assim a estabilidade e tranquilidade públicas, condições essenciais para a democracia.

Mas há igualmente factos preocupantes e que inviabilizam o exercício da democracia: morte de lideranças da sociedade civil, com destaque para líderes indígenas que se batem pelas suas terras.

As Honduras realizaram eleições questionáveis em 2017. De acordo com os observadores, as eleições não respeitaram os padrões aceitáveis. No processo de contagem o resultado indicava vitória da oposição, mas a última da hora foi alterado a favor do partido no poder. Eleições municipais igualmente questionáveis foram realizadas na Nicarágua a favor do grupo que detinha o poder, chefiado por Daniel Ortega. Centralizaram o poder e reformaram a justiça para pior, cujas vítimas agora são os cidadãos e a democracia.

Por sua vez, a Bolívia fez grandes progressos sociais nos últimos oitos anos sob comando de um presidente indígena, Evo Morales, mas o poder o seduziu, e manipulou o tribunal constitucional para pôr fim aos limites do mandato presidencial, abrindo portas para manter o poder vitalício e instalar a ditadura.

Do México não vêm bons sinais: elite política profundamente corrupta colocou jornalista e activistas sob vigilância dos serviços secretos porque estes dois grupos trabalham arduamente para combater e denunciar a corrupção.

África: sombras e penumbras no processo de democratização. Sinais de esperança

A partir de 1990 os ventos da democracia sopraram sobre a África. De lá para cá a maior parte dos países do continente realizaram eleições questionais. Mas o continente tem democracias vibrantes como são os casos de Cabo Verde, Ilhas Maurícias, Botswana, Namíbia, Benim, São Tomé e Príncipe, Gana, África do Sul e Senegal.

Infelizmente, a maior parte dos países de África não têm uma cultura política democrática, mas há sinais claros de esperança de que estes países serão livres no futuro porque a população maioritariamente jovem que compõem estes territórios têm demandado por sociedades abertas e democráticas como indicam os seguintes registos históricos recentes:

Protesters hold posters asking President Mugabe to step down, on which one has handwritten "37 years for nothing", at a demonstration at Zimbabwe Grounds in Harare, Zimbabwe Saturday, Nov. 18, 2017. Opponents of Mugabe are demonstrating for the ouster of the 93-year-old leader who is virtually powerless and deserted by most of his allies. Writing in Shona on poster refers to Mugabe in a respectful way saying "Go and rest now". (AP Photo/Ben Curtis)

A primavera Árabe que começou no norte de África levou a Tunísia para um processo de democratização notável, embora haja igualmente sinais de preocupação desde 2016.

Esta onda de protestos, mais tarde se estendeu para outros países a sul do continente tendo os jovens no comando e com as mesmas reivindicações: “queremos democracia, fim da corrupção, transparência, imprensa livre e bem-estar social.” Estas exigências registaram-se em países como Burkina Faso, Burundi, Camarões, África do Sul, RDC, Togo, Angola e Zimbabwe.

Construir e manter as democracias

A luta pela instauração da democracia e sua manutenção, deverá variar as estratégias e bandeiras de luta, de acordo com os contextos e as variáveis envolvidas. Empenhar-se na luta para a instauração de uma sociedade aberta onde nunca houve democracia, como são os casos dos Camarões, Guiné Equatorial, China, Djibuti, Coreia do Norte, não será semelhante a levar a cabo uma luta pela manutenção/continuidade e aprofundamento da democracia no Botswana, na Namíbia, na Costa Rica ou na Noruega.

Ali onde se reconhece a existência da democracia, mesmo que em declínio, é crível e ideal que a luta esteja focada na qualidade e intensidade da democracia, e em pautas como a integração e reconhecimento do Outro enquanto corpo racializado sociologicamente; no problema das minorias, no voto dos imigrantes e sua participação na vida pública, nos direitos bioéticos, envolvimento da sociedade civil e do parlamento na monitorização do sector de defesa e segurança, na implementação do rendimento mínimo universal ou não, na democracia participativa de grande intensidade e não somente na representação.Num regime reconhecidamente autoritário, a luta estará inicialmente focada na conquista de eleições livres, regulares e credíveis, a busca por um sistema judicial independente, uma imprensa livre, uma sociedade civil vibrante e o rol dos direitos sociais.1mar2018---ex-presidente-luiz-inacio-lula-da-silva-pt-concede-entrevista-a-agencia-afp-1519949463184_615x300

Embora a luta no primeiro caso seja elementar, pelas suas demandas, é a luta mais dura. Não é espectável que alguém seja assassinado nas Ilhas Maurícias ou na Nova Zelândia por lutar pelo aprofundamento e manutenção da democracia. O oposto será espectável, e mais: quem luta pela democracia no interior de um regime autoritário deve estar preparado para morrer ou passar por outras privações: exílio, fome, desemprego induzido, prisão, etc.

Penso que tanto ali onde existem democracias, e se luta para a sua consolidação, quanto ali onde existem regimes autoritários, ditaduras instaladas ou ditaduras eleitorais, mas encapuzadas no minimalismo eleitoral e os seus arquitectos chamam democracia, não se pode perder de vista estas três questões revisionistas e críticas: i) Que tipo de democracia queremos? ii)Esta democracia capturada pelo mercado? iii) Esta democracia que estilhaçou o mundo político, e entregou a soberania das nações às instituições financeiras internacionais ao serviço do capital virtual?

Na luta contra a opressão e pela democracia, existem quatro caminhos possíveis: a guerrilha, a guerra convencional, o golpe de Estado e o “desafio político” ou “desobediência civil”.

Tenho preferência pela última via por ser radicalmente pacífica. É realista desencadear o desafio político ou a desobediência civil frente a um regime feroz, selvagem e delinquente? Sim! Mas não é fácil e nem sequer deve ser num piscar de olhos. A luta contra a ditadura, regra geral deverá durar anos. Os democratas pacíficos deverão cultivar uma “ética da libertação” onde a paciência, a inteligência, o planeamento são fundamentais para ir destruindo a ditadura paulatinamente e no momento exacto levar à cabo um movimento de grandes proporções em massas populares. Segundo Desmond Tutu, “muita gente pensa que as armas de fogo são fonte de medo [dos detentores de poder]. Não. O maior medo do ditador é quando as pessoas decidem ser livres”.

Pegar em armas levaria a ditadura à agradecer, na medida em que teria legitimidade tanto interna quanto externa para exterminar. Por outro lado, usar armas seria atingir um dos ângulos mais fortes do ditador. Ele tem mais armas que os democratas (que se pode obter), assim como logística e toda engenharia financeira. Usar armas demonstra que somos semelhantes ao ditador e perderíamos autoridade moral e legitimidade democrática. As armas são incompatíveis com a biodemocracia (ética e cultura política) que se pretende construir na sociedade pós-autoritária.

Em síntese: a) a luta pacífica — desafio político ou desobediência civil —  penso ser o melhor caminho para a conquista e manutenção da liberdade e democracia; b) a guerra não garante vitória aos democratas e as possibilidades de perdas humanas do lado das forças democráticas é inevitável; c) um Golpe de Estado representa retrocesso civilizacional (embora hajam casos excepcionais de sucesso que levaram a democracia: Portugal em 1974 e Ghana em 1979). Na maior parte dos casos, o golpe viabilizou o nascimento de uma nova ditadura militar; d) os cidadãos que decidirem empreenderem a luta pela democracia devem contar exclusivamente com as suas forças internas que virão da solidariedade e da confiança colectiva; e) as possibilidades da comunidade internacional auxiliar os combatentes pela liberdade, são boas quando estiverem há segundos de ruir o edifício da ditadura; f) Finalmente, os democratas devem ter cuidado com ajudas de última hora porque visam interesses instalados. Caso sejam necessárias, há que celebrar acordos que beneficiem socialmente os cidadãos. E de preferência envolver as múltiplas fontes de poder democrático nas negociações como forma de demarcar-se da imagem anterior. Os acordos devem ser claramente de esquerda.

Para além da democracia representativa. Biodemocracia como meta

Segundo Mbembe «a inimizade tornou-se num aspecto central da vida política contemporânea onde a busca do inimigo é parte integrante da vida das democracias e o racismo seu “depósito primeiro” que permite construir o inimigo. O fantasma da fronteira desemboca na política do muro e do campo, em que uma horda de pessoas é mantida à parte e fora de portas onde se erguem muros físicos e simbólicos, construindo o inimigo no direito e na lei, mas também nos fantasmas sociológicos. Assim, o político deixa de ser o espaço que “jugula a violência” física e simbólica, e a guerra a “derrota da imaginação moral”, para ser o seu motor.»

Esta democracia liberal da inimizade que já se tornou não mais a promotora da dignidade humana e da vida, mas sim, contra a vida ao lado de outras categorias antivida como o Nazismo, a escravidão e a bomba atómica. Diante desta miséria política ocidental, a partir de uma crítica da razão negra vinda de África, Mbembe propõe a superação da cultura política liberal da inimizade por meio da “democracia do em-comum.” O conceito de “democracia do em-comum” supõe que temos um só mundo e que nos pertence a todos, corpos vivos, humanos, animais, vegetais, moleculares, e que ele é incompatível com uma economia política das pulsões identitárias que conduzem ao “deleitamento, à inversão e à saída da democracia.”MBEMBE-A-2

Esta “democracia do em-comum”, aplaudida por Mamadou Ba, para mim é uma clara superação da democracia liberal ocidental. Este antídoto ao desejo de apartheid, ao ódio, as fronteiras, ao fechamento e as paredes contra o movimento universal dos corpos bestializados, se não for BIODEMOCRACIA, o que mais representaria e o que chamaríamos?

Os obstáculos que somarão aos anteriores e se oporão ao avanço da biodemocracia convivem todos os dias com os cidadãos: o deus dinheiro ao qual os Estados e candidatos venderam a sua liberdade e soberanias, a midia tradicional manipuladora e entrosada no mundo das finanças e finalmente as novas midias digitais ampliaram a manipulação e destruíram a autenticidade da votação expressa nas urnas.

 

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